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O limite de renda de R$ 40 mil por ano para que o contribuinte possa fazer a declaração simplificada de Imposto de Renda, conforme proposta de reforma apresentada na última semana pelo governo Jair Bolsonaro (sem partido), vai prejudicar o brasileiro de classe média de menor renda e que não tem deduções com dependentes.
Segundo o projeto do governo, o desconto de 20% fica restrito a quem recebe até R$ 40 mil por ano —ou seja, até R$ 8.000 de abatimento. Hoje, o percentual é aplicado sobre a base de cálculo de imposto, com limite de R$ 16.754,34.
Cálculos feitos pela Unafisco Nacional (Associação Nacional dos Auditores Fiscais da Receita Federal do Brasil) a pedido da Folha mostram que a mudança pode mais que dobrar o valor do imposto pago pelo contribuinte que ganha acima do teto anual e não tem dependentes.
Um exemplo: sem ter deduções a fazer com dependentes, despesas com instruções ou despesas médicas, o que aliviaria no cálculo final do imposto, um contribuinte com renda anual de R$ 48 mil (ou R$ 4.000 por mês), que teria de recolher R$ 630 pela declaração simplificada, passaria a pagar R$ 1.329,68 com a versão completa —aumento de 111%.
Para um chefe de família com a mesma renda anual, mas com dois dependentes, a situação se inverte e a declaração completa fica mais vantajosa. Em vez de recolher os R$ 630 da modalidade simplificada, ele poderá pagar R$ 104,35 pela completa, considerados os descontos com instrução e dependentes.
Na avaliação do presidente da Unafisco, Mauro Silva, a medida onera uma fatia já fragilizada dos contribuintes. "Quem ganha mais de R$ 10 mil por mês até consegue ter plano de saúde e colocar o filho na escola particular e já usava o formulário completo de declaração. Mas esta não é a situação de vários outros contribuintes."
Quando esse contribuinte é retirado da modalidade simplificada e tem de pagar mais imposto, acaba comprometendo uma parcela maior da sua renda.
Para Silva, a proposta do governo acerta ao reajustar a tabela, mas erra ao punir a classe média de menor renda, e essa é uma distorção que o Congresso precisa corrigir ao avaliar a reforma.
No caso de um contribuinte com renda anual de R$ 60 mil, igualmente sem deduções, o acréscimo no Imposto de Renda a pagar será de 47,7% com a declaração passando de simplificada para a completa, ou de R$ 2.070 para R$ 3.056,52.
Da mesma forma, a declaração completa é mais desvantajosa para quem não tem dependentes e recebe uma renda anual de R$ 120 mil. Neste caso, o contribuinte irá pagar 13,1% a mais de imposto na declaração completa, ao não poder optar pela modalidade simplificada, uma diferença de mais de R$ 2.125.
Já para o contribuinte sem despesas com dependentes e com renda anual de R$ 180 mil, a diferença entre tipos de declaração cai, mas ainda é significativa: de 6,5% a mais.
As contas da entidade já consideram as despesas com Previdência para todas as faixas de renda.
"Não tem de ter teto para a declaração simplificada. Quem ganha mais acaba não usando o desconto padrão, mas quem mais precisa é quem recebe até R$ 6.000 por mês", diz Silva.
A mudança acaba afetando a baixa classe média, reforça o economista do Insper Sérgio Firpo. "O governo parece não ter tido coragem de mexer nas deduções de gastos com saúde e educação e precisava tirar de algum lugar para garantir o aumento da faixa de isenção do IR."
A proposta do governo entregue à Câmara na última semana também detalha a mudança na faixa salarial de isenção do IR, que iria dos atuais R$ 1.903,98 para R$ 2.500.
Atualmente, o contribuinte pode optar pelo modelo simplificado de declaração, sem precisar incluir gastos para dedução de imposto e podendo contar com o desconto padrão.
Em 2019, 17,5 milhões de brasileiros declararam Imposto de Renda pelo formulário simplificado e o imposto devido totalizou R$ 60 bilhões.
Ao propor a mudança na semana passada, a expectativa do Ministério da Economia é que a medida eleve a tributação de milhões de contribuintes. Segundo a pasta, a mudança pode levar a um aumento de R$ 9,9 bilhões na arrecadação no ano que vem e de R$ 10,2 bilhões em 2023.
De acordo com estudo dos pesquisadores Manoel Pires e Fábio Goto, do Observatório de Política Fiscal do Ibre/FGV (Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas), o teto para o imposto simplificado poderá atingir 2 milhões de pessoas.
Em reportagem recente, a Folha apontou que, desde o ano passado, o governo já queria acabar com o mecanismo da declaração simplificada. Na formulação final da proposta, porém, a pasta do ministro Paulo Guedes acabou optando por manter essa opção para faixas menores de renda.