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O extravio ou a entrega tardia de correspondência endereçada ao condômino por negligência de representante do condomínio configura ato ilícito, e o condomínio fica responsável por reparar os prejuízos causados ao destinatário.
Com esse entendimento, a 4ª Vara Cível de Taguatinga, no Distrito Federal, condenou um condomínio a indenizar um morador que não recebeu uma intimação judicial. Foram fixados os valores de R$ 7,6 mil por danos materiais e R$ 8 mil por danos morais, a serem corrigidos pelo índice nacional de preços ao consumidor (INPC).
O caso
Em 2019, o Tribunal Regional do Trabalho da 10ª Região enviou uma notificação a um homem para que comparecesse a uma audiência. Uma funcionária do prédio onde ele morava teria recebido a correspondência, mas o documento não foi entregue ao morador.
O condômino contou que tomou conhecimento da demanda apenas dois meses após a audiência, e que não teve tempo hábil para a defesa. A sentença do processo trabalhista foi publicada em março de 2020.
No mesmo dia, o homem tentou ingressar no processo para noticiar a irregularidade na citação, mas foi informado de que a carta havia sido recebida pela zeladora de seu prédio. Em seguida, o juiz lhe aplicou uma multa por litigância de má-fé, de 5% sobre o valor da causa. Diante da revelia, o morador foi condenado a pagar um total de R$ 15,9 mil, referente ao valor líquido da condenação mais custas e multa.
Os funcionários do prédio disseram não se lembrar da carta, e não havia registro da entrega nos cadernos de correspondência. O condomínio, em defesa, relatou que não havia porteiro durante o dia, e que a zeladora do prédio receberia as correspondência de favor. Ela seria orientada a interfonar nos apartamentos e solicitar a retirada. Após três dias da comunicação, colocaria a correspondência na caixa dos correios. Caso não coubesse, ela manteria em sua posse até o morador retirá-la.
De acordo com a advogada Carolina Cabral, do escritório Ferraz dos Passos Advocacia, que representou o morador no processo, "apesar de o condomínio alegar ter caixas de correios individualizadas para as correspondências de tamanho padrão, ficou comprovado que a notificação advinda da Justiça do Trabalho tinha tamanho superior aos suportados pelo referido espaço".
Fundamentos
A juíza Lívia Lourenço Gonçalves lembrou que o condomínio responde por falhas praticadas por seus funcionários: "O fato de dispor de um funcionário para o recebimento das correspondências, independentemente da função para o qual ele foi originalmente contratado, atrai para o condomínio a responsabilidade quanto à guarda dessa correspondência", ressaltou.
Para ela, o recebimento e distribuição das correspondência não seriam feitos por "favor" aos destinatários, mas sim como parte da atividade profissional da zeladora. Os condôminos sequer tinham a opção de receberem a correspondência pessoalmente.
Em audiência, a zeladora reconheceu que nem sempre registrava as correspondências recebidas no livro do condomínio. "A falta de formalidade e cuidado quanto à anotação em caderno próprio de todas as correspondências recebidas também atrai para o condomínio a prova quanto à efetiva entrega", acrescentou a magistrada.
Lívia indicou que o réu não apresentou imagens, gravações ou depoimentos de testemunhas que comprovassem a entrega da carta ao autor. Segundo ela, não seria possível exigir do morador a prova de "não recebimento" do documento.
No entanto, a juíza apontou que o autor não demonstrou as suas reais chances de êxito na demanda trabalhista caso tivesse sido intimado corretamente. Por isso, condenou o condomínio a pagar apenas metade do valor ao qual o condômino foi condenado.
A magistrada também não responsabilizou o condomínio pela multa por litigância de má-fé, já que ela teria sido causada pela atuação processual do morador no processo, e não pelo extravio da correspondência. "Ao que parece, nos embargos apresentados pelo autor não havia referência previa sobre o recebimento da correspondência pelo condomínio, o que incutiu no juiz a presunção de má-fé", explicou.
Ainda assim, Lívia considerou justa a condenação por danos morais. "Fica claro nos autos a angústia do autor por ter sido cerceado de seu direito ao exercício do contraditório e ampla defesa e, ao final, ter sido condenado no processo", destacou ela. Para a juíza, houve abalo à condição psíquica e à imagem do condômino, já que "a revelia induz a presunção de descaso do autor para com o processo".