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A Vara Única da Comarca de Mesquita, em Minas Gerais, autorizou a adoção de uma adolescente de 15 anos pelos avós, pais adotivos da mãe biológica da jovem. O caso de adoção avoenga resguarda a relação afetiva que a menina tem com os avós, responsáveis por sua criação desde o nascimento, e levou em conta a destituição do poder familiar.
De acordo com os autos do processo, os avós, casados há mais de 30 anos, adotaram uma bebê de nove meses, em 1985, e que, aos 22 anos, engravidou-se e deu à luz a uma menina, em 2007. A criança, desde os primeiros anos de vida, está sob os cuidados do casal. Em 2014, os dois iniciaram o processo de regularização da guarda da jovem.
Eles afirmaram que sempre cuidaram da neta, "uma vez que os genitores nunca dispensaram os cuidados necessários ao crescimento saudável da infante". Diante disso, eles pediram na Justiça que os pais biológicos da adolescente fossem destituídos do poder familiar e, assim, concedessem-lhes a adoção.
O caso esbarra no § 1º do artigo 42 do Estatuto da Criança e do Adolescente – ECA, que veda a adoção por ascendentes. No entanto, essa situação é possível quando for justificada pelo melhor interesse da criança, conforme determinado pelo Superior Tribunal de Justiça – STJ.
"Embora exista norma proibitiva expressa no ECA a despeito da adoção avoenga, o STJ reconhece a excepcionalidade quando preenchidos alguns requisitos. Portanto, não é em qualquer situação que os avós são responsáveis pelo neto que será possível solicitar a adoção. A viabilidade do pedido deve ser analisada por um especialista", afirma Kamila Anicio de Sousa, advogada dos avós e membro do Instituto Brasileiro de Direito de Família – IBDFAM.
Requisitos para adoção avoenga
O STJ postula oito requisitos para viabilizar a adoção avoenga, como a necessidade de que o pretenso adotante seja menor de idade e os avós exerçam, com exclusividade, as funções de mãe e pai do neto desde o nascimento. Também é necessário que a parentalidade socioafetiva tenha sido atestada por estudo psicossocial e que o adotando reconheça os pais biológicos como irmãos.
O processo também precisa reconhecer a inexistência de conflitos familiares a respeito da adoção, bem como a ausência de perigo de confusão mental e emocional a ser gerada no adotando. Considera-se, ainda, que a adoção seja por motivos legítimos e apresente reais vantagens para o neto.
“No caso em apreço, todos os requisitos foram devidamente demonstrados no processo e reconhecidos em sentença pela juíza, especialmente levando em consideração o estudo psicossocial realizado, que constatou que a adolescente, que reside com os avós adotivos desde pequena, é muito ligada afetivamente a eles”, explica Kamila.
“Os avós são a principal referência de pai e mãe para a jovem e ela os reconhece como tais. A adolescente tem seus direitos básicos, como moradia, acesso à saúde, educação, afeto, proteção, convivência familiar e comunitária, preservados pela família, ora requerente, não havendo nada que os desabone a assumirem a adoção da neta”, ela afirma.
Adoção traz ganhos para a adolescente
Para a advogada, do ponto de vista social, o processo evidenciou que a adoção com a destituição do poder familiar traria ganhos reais para a adolescente, uma vez que “a referência que ela possui de pais são os avós e vem sendo construída satisfatoriamente com eles, desde que ela era bebê”.
“Além disso, embora os genitores biológicos da infante tenham sido citados pessoalmente a respeito do processo, sequer se deram ao trabalho de apresentar qualquer manifestação, demonstrando o completo desinteresse em relação à situação da jovem. Na prática, eles nunca foram efetivamente os pais dela”, pontua.
Kamila Anicio acrescenta que a adolescente, desde o nascimento, nunca estabeleceu vínculos maternais com a mãe, a quem sempre tratou como irmã. “Agora a jovem se torna oficialmente irmã de sua genitora. Digo, oficialmente, pois, segundo se constatou no processo, essa já era a vida que a adolescente tinha.”
A advogada avalia que, apesar de a adoção avoenga ser um tema relativamente novo, o fato de muitos avós assumirem o papel de pais e mães não é uma novidade na configuração das famílias brasileiras. Para ela, legalizar a situação “atende ao melhor interesse dos infantes, trazendo dignidade para sua vida, vez que, na prática, seus verdadeiros pais são aqueles que cuidam e são presentes, e não simplesmente aqueles que constam em seus registros de nascimento”.