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O artigo que permitia a suspensão de contratos de trabalho sem o pagamento de salário foi derrubado pelo governo, mas a manutenção dos demais pontos ampliou o poder das empresas nas negociações durante o período de calamidade pública.
O direito ao fechamento de acordos individuais está mantido na MP 927 e foi confirmado pelo ministro Marco Aurélio, do STF (Supremo Tribunal Federal), relator de ação que buscava declarar a inconstitucionalidade da medida provisória.
Ele negou pedido de liminar para suspender os efeitos da norma –as MPs começam a valer na data da publicação. A ação foi apresentada pelo PDT e pedia a derrubada integral da medida.
Para Marco Aurélio, o artigo que prevê a celebração de acordo individual não viola a Constituição. O relator também considerou válidos os outros pontos da medida provisória. A decisão de Marco Aurélio ainda será submetida ao plenário.
Além do artigo 18 da MP, que permita a suspensão dos contratos sem o pagamento de salários e acabou revogado pelo presidente Jair Bolsonaro, o artigo 2º, que trata dos acordos, também foi alvo de críticas de sindicatos e teve sua constitucionalidade questionada.
Esse trecho específico da medida provisória 927 diz que “empregado e o empregador poderão celebrar acordo individual escrito, a fim de garantir a permanência do vínculo empregatício, que terá preponderância sobre os demais instrumentos normativos, legais e negociais, respeitados os limites estabelecidos na Constituição.”
Para o ministro Marco Aurélio, desde que a norma constituição é necessário conservar a liberdade dos empregadores em momentos como o atual.
“A liberdade do prestador dos serviços, especialmente em época de crise, quando a fonte do próprio sustento sofre risco, há de ser preservada”, diz, na decisão.
Na avaliação do professor de direito do trabalho da FMU (Faculdades Metropolitanas Unidas) Ricardo Calcini, a medida provisória inverteu a lógica da regra formal. Até então, a legislação definia que nenhum negociação individual poderia se sobrepor a acordos coletivos ou à CLT.
“Agora, eu, junto ao meu empregador, com o propósito de manter minha relação de emprego, posso firmar um acordo individual”, diz.
Calcini considera importante destacar que a necessidade de o acordo prever a manutenção do vínculo de emprego, pois esse é o ponto central do artigo da MP.
Um dos fundamentos da decisão do ministro Marco Aurélio, avalia o professor, é o artigo 8º da CLT, segundo o qual o interesse coletivo se sobrepõe ao individual.
“Nesse sentido, manter postos de trabalho é um interesse coletivo”, diz Calcini. Para ele, as empresas que já fecharam acordos individuais podem ter essas negociações contestadas.
Isso porque, apesar de a reforma trabalhista já ter dado prevalência aos acordos, os casos de redução de salário ou suspensão de contrato ainda demandariam negociação coletiva.
Domingos Fortunato, sócio da área trabalhista do Mattos Filho, diz que, de fato, a Constituição Federal prevê a necessidade dessas medidas serem definida por negociação coletiva.
Porém, a situação de excepcionalidade do contexto atual também deverá ser considerada.
“O espírito da MP 927 é esse, dar rapidez para as decisões. O acordo coletivo demanda uma assembleia, tem um processo mais logo envolvido. Temos situações em que os sindicatos não estão nem respondendo, porque estão fechados mesmo”, afirma.
Na avaliação dos especialistas, a decisão do ministro Marco Aurélio pode ser um indicativo de que o entendimento judicial poderá considerar as condições atuais das empresas como de exceção. Sem produção, sob um decreto de calamidade pública, certas regras poderiam ser interpretadas com mais maleabilidade.
Na última semana, diversos sindicatos fizem ajustes aos acordos e convenções coletivas na tentativa de conter eventuais demissões.
Diante da quase paralisia da economia devido à pandemia, comércio, bares, restaurantes, transporte rodoviário e aéreo e diversos setores industriais vêm pressionando o governo Bolsonado a definir medidas de socorro financeiro, como a postergação no pagamento de impostos e linhas de crédito para a financiar a folha de salários.
Até agora, micro e pequenas empresas (aquelas que faturam, por ano, de R$ 360 mil e R$ 10 milhões) conseguiram a liberação de R$ 40 bilhões para financiamento de salários.
Uma nova medida provisória também estaria em fase final de elaboração e deverá prever a possibilidade de suspender o contrato de trabalho em até 70% –quando maior a renda, maior o corte.