Utilizamos cookies para oferecer melhor experiência, melhorar o desempenho,
analisar como você interage em nosso site e personalizar conteúdo. Ao
utilizar este site, você concorda com o uso de cookies.
Para maiores informações acerca do tratamento de dados pessoais,
acesse nossa Política de Privacidade.
O Supremo Tribunal Federal – STF decidiu por unanimidade que a tese de legítima defesa da honra, usada em casos de feminicídio e violência contra a mulher, é inconstitucional. A decisão impede que advogados de réus sustentem a tese ou qualquer argumento que induza à ela, nas fases pré-processual ou processual penal e perante o tribunal do júri, sob pena de nulidade do ato e do julgamento. A Corte já havia apresentado maioria neste sentido, mas o julgamento só foi concluído na sexta-feira (12).
O debate ocorreu na Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental – ADPF 779, protocolada pelo Partido Democrático Trabalhista – PDT, que pedia uma interpretação constitucional a trechos do Código de Processo Penal – CPP para que se afirme que tais permissivos legais à legítima defesa enquanto excludente de ilicitude penal (e civil) não possuem, em seu âmbito de proteção (seu suporte fático), uma autorização para assassinar pessoa que comete (ou foi acusada de) adultério, à luz da “nefasta, horrenda e anacrônica tese de lesa-humanidade da legítima defesa da honra”.
Em seu voto, ainda no início do julgamento, o relator, ministro Dias Toffoli, considerou que a tese é inconstitucional por violar os princípios da dignidade da pessoa humana, da proteção à vida e da igualdade de gênero. O entendimento foi seguido pelos ministros Marco Aurélio, Alexandre de Moraes, Rosa Weber, Nunes Marques, Cármen Lúcia, Ricardo Lewandowski e Luiz Fux.
Gilmar Mendes, Edson Fachin e Luís Roberto Barroso também rechaçaram a legítima defesa da honra, mas com ressalvas para assegurar entendimento em maior extensão. Segundo Mendes, o entendimento assentado pelo STF deve ser aplicável a todos os envolvidos na persecução penal, e não somente à defesa.
"Obstar à defesa, à acusação, à autoridade policial e ao juízo que utilizem, direta ou indiretamente, a tese de legítima defesa da honra (ou qualquer argumento que induza à tese) nas fases pré-processual ou processual penais, bem como durante julgamento perante o tribunal do júri, sob pena de nulidade do ato e do julgamento", pontuou.
Já os ministros Edson Fachin e Luís Roberto Barroso entenderam que cabia exclusão da interpretação "da odiosa figura da legítima defesa da honra", de modo que a decisão do Tribunal de Justiça que a anula é compatível com a garantia da soberania dos vereditos do Tribunal do Júri.
Naturalização do feminicídio
"A soberania dos veredictos do júri não lhes permite proferir decisões arbitrárias e violadoras de direitos fundamentais, mas apenas decisões coerentes com as provas dos autos e com o Direito em vigor, consoante jurisprudência torrencial do STF", defendeu o advogado Paulo Iotti, membro do Instituto Brasileiro de Direito de Família – IBDFAM, em entrevista recente sobre o tema. Ele protocolou a ação do PDT.
De acordo com o especialista, a "nefasta e anacrônica" tese de lesa-humanidade da legítima defesa da honra naturaliza o feminicídio e abre perigosa margem para que júris absolvam homicidas motivados por ódio e preconceitos sociais. Segundo ele, o argumento também já fora utilizado para "justificar" assassinatos homotransfóbicos.
"Não há nenhum prejuízo ao direito de plenitude de defesa na proibição do uso de teses manifestamente inconstitucionais, porque são de lesa-humanidade. É incoerente as pessoas falarem que acham a tese deplorável e inaceitável, mas dizerem que o júri poderia absolver homicidas por ela: isso implica concordância com a constitucionalidade dessa tese, com o que não se pode concordar de forma nenhuma", explicou o advogado.